domingo, 6 de novembro de 2016

A menina Mietta Floresta

       DEZ


      Amava gravar vídeos
      seu sonho era ser uma youtuber,
      ter seguidores e livro intimista publicado.
      - Inscreva-se no meu canal!
      - Não te iludas
      isso vai sair de moda.
      Sorria e nada ouvia,
      viajava nas conchas
      que escolhia na praia.
      

      VINTE


      Pesquisava na internet:                                                                            
      o feto fala, Fo.           
      Declarações subversivas
      textos antropofágicos
      ódio à burguesia claustrofóbica
      densidade nos argumentos
      - arte é posse -
      escreveria, diria, Dario,
      livre, liberdade!


      Muitos seguidores
      e mais depressa,
      policiamento, censura, ofensa,
      propostas de sexo virtual...
      As sensações de medo
      intensificavam o sono com enredo,
      sonhos eram proibidos.
      Sua única partida
      o álcool qualificado, a cannabis,
      sem coca,
      nunca, é a heroína.


      Ordenava à mente
      dorme tanto quanto possível.
      Ela desobedecia.
      Com o cansaço do eu sujeito,
      ela virava objeto.
      Para seus olhos meio molhados,
      o que não era percebido
      sabia que não podia fazer.
      Tudo está
      no insondável dos olhos.
      Fugia do espaço da autencidade
      da sensação de pertencimento de si mesmo
      da benevolente idade,
      quando tudo então parecia verdade,
      quando tudo então era possível adiar.


      TRINTA


      Chegara ao mundo
      dos que negociavam consigo mesmo,
      punha beatitude na expressão,
      fazia aflorar as expectativas da alma.
      Era mulher fora do comum,
      educada como se fosse um homem.
      Tudo parecia melhor,
      mantinha com benevolência
      a distância do espaço da pantomima.


     Trinta anos de esperança,
      os matizes do passado
      seus olhos não mais viam.
      Navegava
      não encalhava no que estava por vir,
      - no destino -
      declarava nos ventos
      que a liberdade era a sua palavra de ordem,
      liberdade de vestir, de dizer,
      de ignorar falas.


      Na casa limpa do puro,
      escrevia e falava,
      mas devagar percebia,
      que esse mundo sem ouvintes,
      dava um sono.


      QUARENTA


      Quarenta anos... e cinco.
      Agora sou Fulana de Tal.
      Como minha vida está condicional,
      fica definida a vontade
      de estar em outro lugar.


P. S. – Afinidades com: Dario Fo
                                        Mietta Santiago
                                        Nísia Floresta     


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